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Dermatologia Étnica: ciência, identidade e cuidado com a pele negra - Revista Conexão Black




A dermatologia étnica é a área da medicina que estuda as particularidades da pele, dos cabelos e das unhas de pessoas com diferentes tonalidades de pele – especialmente de ascendência africana, asiática e latino-americana.

A pele negra tem características próprias: maior quantidade e distribuição de melanina, camadas da pele mais compactas e uma resposta inflamatória diferente. Essas diferenças influenciam a forma como a pele cicatriza, reage a produtos e manifesta certas doenças.

Reconhecer essas especificidades é essencial para oferecer um cuidado baseado em ciência, eficaz e realmente inclusivo, já que a população negra ainda é pouco representada nas pesquisas médicas e nas imagens usadas para ensinar dermatologia.

Para fala sobre este tema a Conexão Black Brasil convidou a dermatologista, Dra. Najara Gomes, especialista em pele negra, que nos deu uma entrevista esclarecedora sobre o assunto.

 

A pele negra envelhece de forma diferente da pele branca?

Sim. A pele negra tende a envelhecer mais lentamente do que a pele branca, principalmente por ter uma maior concentração de melanina, que é pigmento que dá cor à pele e a protege parcialmente dos danos causados pela radiação solar.

Essa proteção natural retarda o aparecimento de rugas finas e linhas de expressão.

Além disso, a pele negra costuma ter camadas mais espessas e fibras de colágeno mais densas, o que contribui para uma aparência firme e viçosa por mais tempo.

Apesar disso, o processo de envelhecimento não é ausente, mas se manifesta de forma diferente, principalmente por meio de manchas escuras (hiperpigmentação) e alterações no contorno facial.

Por isso, o uso diário de protetor solar com cor, antioxidantes e tratamentos que estimulam o colágeno, sempre respeitando as particularidades da pele, ajudam a manter o equilíbrio e a saúde cutânea ao longo dos anos.

Embora tenha uma resistência maior à radiação solar, a pele negra apresenta tendência à hiperpigmentação e à formação de queloides. Quais cuidados e tratamentos devem ser priorizados para prevenir ou amenizar esses efeitos?

A maior tendência a desenvolver manchas e queloides ocorre devido às suas particularidades biológicas.

Os melanócitos, células que produzem a melanina, são mais ativos e reativos nesse tipo de pele. Isso faz com que qualquer processo inflamatório – como espinhas, feridas, depilação, picadas ou até procedimentos estéticos – possa resultar em manchas escuras, conhecidas como hiperpigmentação pós-inflamatória (HPI).

Além disso, a resposta cicatricial também é mais intensa, o que aumenta o risco de formação de queloides – cicatrizes elevadas e endurecidas causadas por um excesso de colágeno durante o processo de reparo da pele.

A prevenção dessas alterações inclui evitar manipular espinhas ou feridas; usar diariamente protetor solar com cor/com proteção contra a luz visível (que é um dos fatores que mais agravam as manchas na pele negra); escolher profissionais capacitados para realizar procedimentos estéticos.

O tratamento para as manchas pode incluir antioxidantes e agentes uniformizadores - sempre com acompanhamento médico.

Para os queloides, o tratamento pode envolver uso de corticoides intralesionais ou tópico; fitas ou géis de silicone, crioterapia, cirurgia e até lasers.

Essas abordagens devem ser individualizadas, respeitando o tom da pele, o tipo de lesão e a história clínica do paciente.

Estudos recentes mostram que mais da metade da população negra no Brasil nunca consultou um(a) dermatologista. Que impactos essa falta de acesso tem na saúde da pele e na autoestima da população negra?

A falta de acesso a dermatologistas tem impactos diretos na saúde da pele e na autoestima da população negra.

De acordo com um levantamento do Datafolha em parceria com a Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) e o L’Oréal Groupe, divulgado em 2025, 58% das pessoas negras no Brasil afirmaram nunca ter feito uma consulta com dermatologista. Esse dado reflete desigualdades históricas no sistema de saúde e uma formação médica ainda pouco voltada às especificidades da pele negra.

No campo emocional, a falta de acolhimento e de representatividade no atendimento afeta a autoestima e a confiança dos pacientes negros. Pesquisas internacionais reforçam esse aspecto: um estudo publicado em 2024 no International Journal of Women’s Dermatology mostrou que dois terços dos pacientes negros preferem ser atendidos em clínicas especializadas, onde se sentem melhor compreendidos e representados.

Esses dados reforçam que o acesso a dermatologistas preparados para atender diferentes tons e tipos de pele não é apenas uma questão estética – é uma questão de saúde pública e de equidade racial.

Nos últimos anos, a Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) criou departamentos específicos para discutir a dermatologia étnica. Em sua visão, o que ainda falta avançar para que os cuidados com a pele negra estejam plenamente incluídos na formação médica e nas políticas públicas?

A criação do Departamento de Dermatologia Étnica pela SBD-RJ foi um passo fundamental e histórico. Pela primeira vez, uma regional da Sociedade Brasileira de Dermatologia reconheceu, de forma institucional, a importância de discutir as particularidades da pele negra e dos diferentes fototipos, estimulando o ensino, a pesquisa e o cuidado clínico com base científica e representativa.

Nos últimos anos, também vimos avanços práticos, como a consolidação de novos ambulatórios de pele negra além do Instituto de Dermatologia Prof. Rubem David Azulay (Santa Casa do Rio de Janeiro), em São Paulo, no Hospital do Servidor Público Municipal (HSPM) e no Hospital Ipiranga.

Esses espaços têm papel essencial na formação de residentes e na geração de conhecimento aplicado, além de contribuírem para a assistência qualificada à população negra.

Envelhecer com pele negra é um ato de resistência porque, durante muito tempo, a beleza e o envelhecimento foram mostrados com base apenas em padrões eurocentricos.

A dermatologia tem o dever de mudar essa visão, reconhecendo que a pele negra tem características próprias e que o cuidado deve valorizar essas particularidades e não tentar apagá-las.

Do ponto de vista médico, sabemos que a pele negra tem particularidades e isso exige protocolos específicos e produtos adaptados. Por isso, o tratamento deve ser pensado para realçar e preservar a saúde da pele com cuidados que respeitem o tom e suas necessidades.

Nos últimos anos, a dermatologia tem avançado nesse diálogo.

Hoje, já vemos pesquisas clínicas que incluem peles de diferentes tons, produtos desenvolvidos para fototipos altos e mais profissionais negros ensinando, pesquisando e representando o tema em eventos científicos.

Essas mudanças ajudam a construir uma medicina mais próxima da realidade e da identidade das pessoas.

Cuidar da pele negra é também valorizar a história e a ancestralidade. É entender que ciência e representatividade andam juntas – e que a beleza da pele negra está justamente na sua diversidade.

Embora tenha uma resistência maior à radiação solar, a pele negra apresenta tendência à hiperpigmentação e à formação de queloides. Quais cuidados e tratamentos devem ser priorizados para prevenir ou amenizar esses efeitos?

A maior tendência a desenvolver manchas e queloides ocorre devido às suas particularidades biológicas.

Os melanócitos, células que produzem a melanina, são mais ativos e reativos nesse tipo de pele. Isso faz com que qualquer processo inflamatório — como espinhas, feridas, depilação, picadas ou até procedimentos estéticos — possa resultar em manchas escuras, conhecidas como hiperpigmentação pós-inflamatória (HPI).

Além disso, a resposta cicatricial também é mais intensa, o que aumenta o risco de formação de queloides — cicatrizes elevadas e endurecidas causadas por um excesso de colágeno durante o processo de reparo da pele.

A prevenção dessas alterações inclui evitar manipular espinhas ou feridas; usar diariamente protetor solar com cor/com proteção contra a luz visível (que é um dos fatores que mais agravam as manchas na pele negra); escolher profissionais capacitados para realizar procedimentos estéticos.

O tratamento para as manchas pode incluir antioxidantes, agentes uniformizadores, agulhamento, peeling e lasers - sempre com acompanhamento médico.

Para os queloides, o tratamento pode envolver uso de corticoides intralesionais ou tópico; fitas ou géis de silicone, crioterapia, cirurgia e até lasers.

Essas abordagens devem ser individualizadas, respeitando o tom da pele, o tipo de lesão e a história clínica do paciente.

Para encerrar: que mensagem a senhora deixa para negras e negros sobre o cuidado com a pele e o envelhecimento saudável, sem se prender a padrões de beleza eurocentrados?

Cuidar da pele é mais do que vaidade! É saúde, é autocuidado e também uma forma de se reconhecer.

Por muito tempo, pessoas negras não se viram representadas nas propagandas, nos livros e nem nas conversas sobre beleza. Isso gerou distorções, como a ideia de que a nossa pele não precisava de atenção ou que só era bonita quando se aproximava de um padrão que não nos pertence.

A pele negra tem necessidades específicas, mas também muita potência! Envelhece mais lentamente, está mais protegida e responde bem quando é cuidada com produtos e tratamentos adequados. completou a especialista.